Estamos
acostumados a associar a ansiedade com a maturidade, como se as palpitações e a
sensação de falta de controle do tempo fossem um resultado imediato das
responsabilidades da vida adulta. Mas já há crianças sofrendo com esse mal, e
não são poucas: a cada 100 crianças e adolescentes com idades entre seis e 16
anos, 12 sofrem de transtorno de ansiedade. E este número vem aumentando, segundo
levantamento do Centro de Atendimentos e Pesquisa de Psiquiatria Infantil e da
Adolescência.
Problemas na
escola vêm de casa
5 respostas
sobre estresse infantil
Dor de
barriga merece a devida atenção
Só nos
últimos 10 anos, o crescimento registrado foi de 60%. “No consultório, esse
aumento é nítido. Os fatores ambientais, intimamente ligados ao aparecimento
deste tipo de transtorno, estão mais propícios”, relata Jaci Ferfila, psicóloga
especialista em diagnóstico de crianças e adolescentes. “Há mais competição, as
famílias têm menos atividades”. Por isso os pais devem ficar atentos: atitudes
encaradas muitas vezes como manha podem, na verdade, ser sinais de que o filho
está sofrendo de ansiedade.
Como
diferenciar o pedido simples por atenção de um problema mais sério, que requer
ajuda psicológica? “A maneira prática de diferenciar ansiedade normal de
ansiedade patológica é avaliar se a reação é de curta duração e relacionada ao
estímulo do momento ou não”, relata o estudo “Transtornos de ansiedade”,
realizado pelos psiquiatras Ana Regina Castillo, Rogéria Recondo, Fernando
Asbahr e Gisele Manfro, e publicado na Revista Brasileira de Psiquiatria, a
mais importante do setor.
De acordo
com os especialistas, quando o sentimento passa a ser um problema na vida da
criança, é hora de procurar ajuda. “É preciso olhar a criança como um todo, o
jeito dela interagir, de se relacionar e principalmente de brincar, porque
nesse momento ela vai se expressar”, pontua o psiquiatra especializado em crianças
e adolescentes Candido Fontan Barros. “É no brincar que ela repete seus
conflitos internos”.
A importância do brincar.
Perfil do
ansioso
Mesmo quando
a criança não consegue elaborar seus sentimentos em forma de discurso, há
sempre a demonstração de que algo não vai bem. Agitação, euforia, excitação,
apego excessivo e intenso aos pais, problemas de relacionamento com conhecidos
ou familiares, ataques de pânico e dificuldade de aprendizagem são os
principais sintomas. “A criança tem preocupações típicas de adulto, medos
exagerados e reações exacerbadas ou é tímida a ponto de não conseguir fazer
amigos”, descreve Carolina Gouvêa da Costa, psiquiatra do Ambulatório de
Ansiedade na Infância e na Adolescência (Ambulansia), do Instituto de
Psiquiatria do Hospital das Clínicas, de São Paulo. Em muitos casos, o próprio
corpo dá sinais: dores de barriga, dores na cabeça, vômitos, suor excessivo,
mãos frias e, em casos mais graves, palpitações, tonturas e falta de ar.
Mateus, de
apenas 11 anos, sempre foi o mais agitado entre os quatro irmãos. Quando entrou
no primeiro ano, começou a ter problemas na escola. “Na época, ele não sabia
ler. Os colegas de classe, no entanto, já sabiam. Ele se sentiu pressionado,
foi ficando nervoso, tinha dores de barriga e de cabeça. A partir dali, fiquei
de olho e durante uma semana tive que ajudá-lo com a leitura. Em pouco tempo
ele começou a ler e a ansiedade diminuiu”, relata a mãe, Daise Mendes Oliveira.
Apesar do apoio, o rendimento de Mateus cai toda vez que as tarefas escolares
exigem atenção. “Ele é imediatista, não consegue se concentrar por muito tempo
e tem dificuldade em começar e terminar alguma coisa. Geralmente ele para no
meio”. Para resolver problemas de matemática, o garoto lê as primeiras linhas e
já quer fazer as contas. O resultado vem em notas vermelhas no boletim.
O que os
pais podem fazer
Quando os
pais notam que algo não vai bem, a recomendação é levar a criança em
psiquiatras ou psicólogos especializados nessa faixa etária. O profissional
pode avaliar adequadamente a situação. O diagnóstico precoce é fundamental,
pois evita que a criança desenvolva patologias mais graves no futuro, como
transtorno obsessivo-compulsivo ou síndrome do pânico. “Assim como com o
aparecimento de qualquer sintoma físico procura-se um pediatra, na saúde
psicológica o cuidado deve ser o mesmo”, diz Jaci.
Caso o
quadro de ansiedade seja comprovado, a criança inicia a terapia. Neste caso,
pais também serão envolvidos e orientados sobre como agir. Para Carolina, eles
devem estimular os filhos a enfrentar seus medos e reduzir a cobrança. “Mas
isso deve ser feito gradativamente, de acordo com a evolução da criança”, diz.
Mateus, por
exemplo, frequenta semanalmente o consultório de uma psicóloga para aprender a
criar métodos de concentração há um ano e meio. Mas o desafio não é exclusivo
da criança. A família e a escola também devem colaborar. “A escola foi
comunicada. E eu estabeleço horários e crio rotinas para ele aprender a ter
foco e limite de tempo”, conta Daise. Para as demais mães, ela dá a dica: “É
importante analisar o filho com imparcialidade e aceitar as limitações dele.
Não podemos jogar a culpa no professor, na linha pedagógica e assim por diante.
É preciso dar à criança a chance de crescer”.
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